Chegou o dia de transformar lágrimas em palavras. Talvez o exercício de organizar idéias cause menos dor. Lágrimas secam.....ninguém as vê. Não conseguem vê-las. Palavras, podem ser lidas.... e também podem não ser vistas, podem ser deletadas, apagadas da memória do computador, mas não do coração daqueles que a receberam. Mas palavras são ditas, escritas, falseadas, carregadas de emoção, carregadas de passado e de futuro, tão pouco trazem do presente – se que este ainda exista.
Onde vamos parar? O mundo que não vê, pessoas que não entendem? Que mundo é este que vivemos?! O dia chegou, em que as palavras tomaram as rédeas e proclamaram sua independência. Eis que assumem hoje a função de dizer aquilo que carrego na alma. Pobre ilusão. Palavras são meros símbolos imperfeitos pelos quais julgamos ser possível nos expressar, tão complicadas se fazem, que quanto mais as escolhemos, mais elas nos embaraçam. As palavras expressam tão pouco. Acho que elas mais confundem. As lágrima sim, estas sabem falar, sabem ler os mundos, sabem entender o nosso ser ainda que a nossa tão débil mente seja incapaz de codificar e decodificar aquilo que sentimos, aquilo que carregamos e aquilo que nos inquieta e roubam a paz.
Doces lágrimas, amargas gotas, perdoadoras águas quem dera a palavra pudesse expressá-la. Que tal se por um instante trocássemos de posição e invertêssemos a ordem das coisas. Lágrimas, tu serás a linguagem verbal dos homens e tu palavra exercerá a função das lágrimas. Mas tal como um rio sereno em meio a bela paisagem, chamativo, mas profundo e traiçoeiro, os homens também vertem falsidades, hipocrisias são capazes de mascararem e representarem aquilo que não sentem. Mesmo as mais profundas lágrimas tal como as palavras, por vezes traem nossos sentimentos. Tantas vezes estamos tão confiantes de nós mesmos, do que pensamos, cremos e amamos. E de repente, lá estão elas novamente. Se subjugamos a palavras, relegando-lhes um plano secundária, as lágrimas vem, inundam aliás, um mundo que carregamos nas costas, escondemos nos recônditos da mente para que nem nós mesmo dele tenhamos consciências e de repente, as lágrimas simplesmente nos traem. Lágrimas e palavras, quem pode-lhes confiar algo. Homens, quem sois vós a ponto de meras (meras?!) palavras, códigos e gotas de sentimentos os vençam. Sois capazes de vencer exércitos, eleições, grandes homens, crises e todo um universo, mas não sois capazes de vencer a si próprio.
Lágrimas maculadas! Ó homens onde aprenderam isso? Será que não poderias ter deixado de macular pelo menos as lágrimas? Por que fazem questão de confundir as situações? Vejo que minha estratégia de inverter posições falharia, pois lágrimas e palavras se por um lado relevam aquilo que por vezes tentamos esconder aos mortais, elas também protagonizam peças teatrais aos olhos deslumbrados da pobre platéia. Vai chegar o dia em que as águas vão falar.
Entretanto há muitos que não permitiram fazer parte deste jogo emulativo. Não permitiram que o ser fosse contaminado a ponto de fazerem de suas lágrimas um mecanismo de poder. Para estes as lágrimas oram, falam aquilo que suas almas cansadas e fatigadas já não conseguem mais transformar em signo, fizeram das águas sua linguagem. Pobre humanidade mal consegue ler o que escrevem os homens, códigos e sinais escritos, são tão analfabetos!!! Não saberão ler as palavras do ser !!!! E assim o mundo vai se constituindo de analfabetos de todos os lados, mas os piores iletrados são aqueles que não sabem sentir o outro, lê-lo nas linhas e nas entrelinhas, nas lágrimas e nos sorrisos, nos entre sorrisos e no encher os olhos. Até isso precisamos guardar, enquanto gostaríamos de falar a todos: “Olhem aqui! Não percebem vocês que sofro?!” E então resolvem não mais chorar. Permitem que sólidas pedras se formem no coração. Pedras. Duras, leves e pesadas, não importa! Elas não deixam de ser pedras.... Há quem goste de colecioná-las. Quantas pedras em palavras, quantas palavras em forma de pedra. Preferimos brincar com pedras, atirá-las contra as pessoas mas nunca dissolvê-las. Sim as pedras das alma são solúveis. Certo é que demora-se por vezes encontrar os solventes, mas para cada pedra há um determinado solvente, de produção humana!!!! As pedras precisam ser decompostas, elas foram feitas de lágrimas!!! Da lágrima vieram para as lágrimas voltaram. Não há porque contrariar a ordem natural das coisas!!! Este dia ainda há de chegar, em que os seres humanos desenvolverão os solventes para tantas pedras que os consomem ,de tantas pedras que o cercam. Lágrimas, palavras e pedras... e lágrimas. O dia em que pedras e lágrimas falarão ainda vai chegar.